Jorge de Lima
Ó Meu Jesus, quando você
ficar assim maiorzinho
venha para darmos um passeio
que eu também gosto de crianças.
Iremos ver as feras mansas
que há no jardim zoológico.
E em qualquer dia feriado
iremos, então, por exemplo,
ver Cristo Rei do Corcovado.
E quem passar vendo o menino
há de dizer: ali vai o filho
de Nossa Senhora da Conceição!
– Aquele menino que vai ali
(diversos homens logo dirão)
sabe mais coisas que todos nós!
– Bom dia, Jesus! – dirá uma voz.
E outras vozes cochicharão:
– É o belo menino que está no livro
da minha primeira comunhão!
– Como está forte! – Nada mudou!
– Que boa saúde! Que boas cores!
(Dirão adiante outros senhores.)
Mas outra gente de aspecto vário
há de dizer ao ver você:
– É o menino do carpinteiro!
E vendo esses modos de operário
que sai aos domingos para passear,
nos convidarão para irmos juntos
os camaradas visitar.
E quando voltarmos pra casa, à noite,
e forem para o vício os pecadores,
eles sem dúvida me convidarão.
Eu hei de inventar pretextos sutis
pra você me deixar sozinho ir.
Menino Jesus, miserere nobis,
segure com força a minha mão.
24 de dezembro de 2009
Soneto de Natal
Machado de Assis
Um homem, — era aquela noite amiga,
Noite cristã, berço no Nazareno, —
Ao relembrar os dias de pequeno,
E a viva dança, e a lépida cantiga,
Quis transportar ao verso doce e ameno
As sensações da sua idade antiga,
Naquela mesma velha noite amiga,
Noite cristã, berço do Nazareno.
Escolheu o soneto... A folha branca
Pede-lhe a inspiração; mas, frouxa e manca,
A pena não acode ao gesto seu.
E, em vão lutando contra o metro adverso,
Só lhe saiu este pequeno verso:
"Mudaria o Natal ou mudei eu?"
(Texto extraído do livro "Poesias Completas - Ocidentais", 1901)
Um homem, — era aquela noite amiga,
Noite cristã, berço no Nazareno, —
Ao relembrar os dias de pequeno,
E a viva dança, e a lépida cantiga,
Quis transportar ao verso doce e ameno
As sensações da sua idade antiga,
Naquela mesma velha noite amiga,
Noite cristã, berço do Nazareno.
Escolheu o soneto... A folha branca
Pede-lhe a inspiração; mas, frouxa e manca,
A pena não acode ao gesto seu.
E, em vão lutando contra o metro adverso,
Só lhe saiu este pequeno verso:
"Mudaria o Natal ou mudei eu?"
(Texto extraído do livro "Poesias Completas - Ocidentais", 1901)
21 de dezembro de 2009
Poema de Cícero Melo
Albedo
Cicero Melo
Apenas sou o que cala,
A cicatriz.
Um soco porco que estala
Pela raiz.
Eu sou aquele que entala
Pelo nariz
O vinho tinto da bala,
Escrava, atriz.
Eu sou o falo da fala,
O meretriz.
(Recife, 21 de dezembro de 2009)
Cicero Melo
Apenas sou o que cala,
A cicatriz.
Um soco porco que estala
Pela raiz.
Eu sou aquele que entala
Pelo nariz
O vinho tinto da bala,
Escrava, atriz.
Eu sou o falo da fala,
O meretriz.
(Recife, 21 de dezembro de 2009)
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