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18 de novembro de 2009

Quilombo Brasil

Iremar Marinho

"Faremos um povo de igual rebeldia.
Faremos um povo de bantus iguais.
Faremos de todos os lares fraternas senzalas sem mais.
Faremos a negra utopia do novo Palmares..."
(Missa dos Quilombos, Dom Pedro Casaldáliga, Pedro Tierra e Milton Nascimento)

"Zumbi poderia salvar Palmares, mas já não tenho esperanças".
Esta confissão de desesperança do professor palmarino Dílson Moreira da Costa, na comemoração dos 300 anos de Zumbi, acentuou a expectativa dos afrodescendentes, no vasto quilombo Brasil.

Precisamos esperar 300 anos para ouvir ecoar o grito de Palmares e constatar que a senzala resiste, diante dos quilombolas dispersos. O sistema econômico injusto é nada mais que a oficialização do regime de capatazia, que perpetua a escravidão dos baixos salários, do analfabetismo e da discriminação.

Os mesmos senhores feudais concentram as riquezas, alargando o fosso das diferenças entre as origens nobres européias e o porão dos navios negreiros. A abolição da escravatura não inclui a abolição da fome, da miséria e do preconceito. A servidão das senzalas continuou nas favelas, que são guetos à espera da libertação.

O apartheid brasileiro é ainda mais avassalador, porque lança seus fundamementos perversos na história oficial do país, para a qual a resistência quilombola foi apenas um episódio romântico e heróico, repassado com a perspectiva de que não se repetiria hoje, por não existirem mais os pressupostos da escravidão.

A própria comemoração dos 300 anos de Palmares soou como mais um embuste para encobrir as causas e os efeitos do massacre dos negros, aliado à perenização das desigualdades econômicas, políticas e sociais. Uma faixa, na estátua de Zumbi, no alto da Serra da Barriga, demonstra a traição da história: “Aqui repousa um grande herói do passado”.

Ora, Zumbi é um herói do passado, mas, sobretudo, do presente. Zumbi é o assalariado, o favelado, os humilhados e ofendidos, os sem-eira-nem-beira, os deserdados do Brasil que só existe nas estatísticas da prosperidade. Zumbi somos todos nós, anônimos, nos mocambos do vasto quilombo Brasil.
“Ninguém quer esta vida assim não, Zambi” (Martinho da Vila).